A palavra Camocim significa “pote de barro“, a etimologia foi estudada por filólogos como José Lourenço de Lima, natural de Camocim, professor atuando no Recife, escreveu diversos artigos para o jornal Diário de Pernambuco. Também o escritor Sebastião de Vasconcelos Galvão no Dicionário Corográfico, Histórico e Estático de Pernambuco, escreveu que Camocim é vocábulo indígena, citando estudos da etimologia da palavra realizados por autores como José de Alencar, no livro Iracema. Entretanto, de acordo com o Livro de Tombo da Igreja Matriz da Paróquia São Félix de Cantalice, o termo mais aproximado do vocábulo estudado seria Camotim = pote, mudando o t em c por eufonia, não só porque se aproximava da origem da palavra, mas também concordando com as informações dos antigos do lugar que afirmavam terem sido encontrados no local, várias peças de barro lembrando a forma de potes e panelas, de uma argila que parecia ser muito antiga. Além disso, o nome Camotim ou Camocim se referia a uma serra antes mesmo da constituição de uma povoação pertencente ao município de Bezerros.
Essas informações possibilita várias interpretações sobre a ocupação humana e a história do local, mas o objetivo ao escrever esse texto é chamar a atenção para o silêncio acerca dos índios na maioria nas cidades no Agreste /Semiárido de Pernambuco, a exceção de Pesqueira e Poção, Alagoinha, Venturosa e Pedra; Águas Belas, onde habitam respectivamente os povos indígenas Xukuru do Ororubá, Xukuru de Cimbres e Fulni-ô. Acredito que esse silencio em cidades como Camocim, Bonito, Caruaru, entre outras, deva-se a política indigenista do Governo Imperial que em meados do século XIX, especificamente, após a Lei de Terras de 1850 e a regulamentação em 1854 tornou devolutas as terras dos antigos aldeamentos indígenas, afirmando que em Pernambuco não havia mais índios, pois os mesmos estavam confundidos, misturados com a massa da população e disponibilizando as terras dos antigos aldeamentos para os fazendeiros antigos invasores. O discurso político sobre o desaparecimento dos índios, tinha como objetivos o controle das terras indígenas e a transformação dos índios em trabalhadores assalariados em substituição a mão de obra negra escravizada em vias de extinção legal, o que ocorreu com a Abolição. Na província de Pernambuco, essa política negou a identidade indígena, justificando a extinção dos aldeamentos e transformando índios em trabalhadores assalariados em fazendas da região. Essa política indigenista negando identidade indígena exaltava a mestiçagem, a exemplo, da identidade “cabocla” uma categoria historicamente construída articulada aos conflitos de terra do século XIX. Porém, é importante afirmar que os índios não foram convertidos ou “civilizados” nos moldes esperados pelos religiosos e políticos do Império.
Nesse contexto de desafios e muitas trocas socioculturais entre índios e não índios os povos indígenas transformaram e rearticularam as expressões socioculturais, ritos e crenças, adaptando-as as condições da sociedade na época. Desafios e rearticulações que podem ser percebidas nas entrelinhas das fontes históricas, mas, sobretudo, nas mobilizações indígenas ao longo da história, e, especificamente, a partir de fins da década de 1980 após a aprovação da Constituição Federal em 1988, quando ocorreram grandes mobilizações indígenas pelo direito a demarcação das terras, como reconheceu a Carta Magna, em várias regiões do Brasil e em Pernambuco, como foi o caso dos Xukuru do Ororubá nos municípios de Pesqueira e Poção.
Os discursos oficiais sobre “desaparecimento” dos índios e os preconceitos enfrentados pelos povos indígenas que em geral são ignorados sobre a riqueza histórica e sociocultural na História do Brasil que precisamos conhecer, mas a partir das atuações dos indígenas afirmando as identidades em busca do reconhecimentos de direitos termos a oportunidade de revisitar essa história, para pensar a Educação em nosso município, uma vez que a Lei nº 11.645/2008 determinou a inclusão na Educação Básica o ensino sobre a história e culturas dos povos indígenas, considerando, dentre outras informações, os dados do Censo IBGE/2010 quando apontou um número significativo de pessoas que se autodeclararam indígenas em Camocim de São Félix e municípios vizinhos como Sairé, Bezerros, São Joaquim do Monte e Bonito.
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Maria José Barboza Mestra em História - UFPE Membro da Academia de Letras, Arte e Ciências de Camocim - ALACC |
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